SC dos elétricos

Pesquisa e tecnologia preparam Estado para
ser o primeiro na produção de veículos do país

Pesquisa e tecnologia preparam Estado para ser o primeiro na produção de veículos do país

Com crescimento da frota de carros elétricos, Santa Catarina desponta como berço de desenvolvimento de componentes do que é visto como o futuro da mobilidade urbana e da sustentabilidade

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O ronco dos motores a combustão tem dado lugar ao silêncio dos carros elétricos em Santa Catarina. Cada vez mais, motoristas têm optado por eles, seja pelo impacto ambiental ou pela economia no bolso. Com pioneirismo na pesquisa e na indústria, o Estado desponta como um forte mercado consumidor, mas também potencial produtor do que é visto como o futuro da mobilidade.

 

De acordo com dados do Departamento de Trânsito do Estado de Santa Catarina (Detran SC), se somados todos os veículos que são 100% elétricos em circulação atualmente e as diferentes categorias de carros híbridos, o Estado possui uma frota total de 22.735 veículos. O número considera automóveis, caminhonetes, camionetas, caminhões, ciclomotores, motocicletas, motonetas, ônibus, quadriciclos, triciclos e utilitários.

 

Ao mesmo tempo em que a frota cresce, surgem iniciativas que se aprofundam no estudo e desenvolvimento desse modelo de tecnologia. Adriano Bresolin, professor do Departamento de Eletrotécnica do Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC), coordena o Grupo de Pesquisa EMOL – Laboratório de Eletromobilidade. O projeto é pioneiro no Estado e atua tanto na conversão de veículos a combustão em elétricos quanto com a construção de carros elétricos do zero. 

 

A somatória de atividades de pesquisa, como a formação de mão de obra e a presença de uma multinacional catarinense que desponta na produção de componentes para carros elétricos, faz o pesquisador ser otimista quanto ao futuro do mercado em Santa Catarina.

Nós temos hoje toda a capacidade de ser o primeiro estado brasileiro a ter uma fábrica de veículos elétricos. Basta para ter investimentos — pontua.

O nascimento dos carros elétricos

O nascimento dos
carros elétricos

O início do desenvolvimento dos carros elétricos remete ao começo do século 20, período em que a venda de veículos elétricos chegou a ser maior do que a de carros a combustão. Naquela época, a gasolina estava começando a ser produzida, por ser um derivado de petróleo.

 

— O carro elétrico e o carro a combustão nasceram juntos praticamente. São poucos anos de diferença. O que fez o carro elétrico morrer lá atrás e renascer agora é o mesmo: a bateria — destaca o professor do IFSC, Adriano Bresolin. 

 

Ele explica que na época, em 1912, a bateria era de chumbo e, por ser pesada, tinha pouca autonomia. Os motores também eram de corrente contínua, o que gerava muita manutenção.

 

O que era um problema no carro elétrico se tornou a solução no carro a combustão, já que a bateria passou a ser utilizada nos carros para dar a partida, algo que era de grande dificuldade. Um século depois, o carro a combustão evoluiu, assim como o carro elétrico.

 

— A partir dos anos 70, com o surgimento dos inversores de frequência, da bateria de lítio e dos motores que a gente chama de síncronos e permitem que você tenha ímãs dentro deles e sejam mais eficientes, que você tem um carro elétrico diferente do que se tinha lá no início do século — afirma o professor.

 

Essas novas tecnologias modernizaram o carro elétrico, permitiram sua popularização e o crescimento nas vendas. Além disso, Mauricio Uriona, professor de Engenharia de Produção e Sistemas da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), que atua nas áreas de energias renováveis e eletromobilidade, explica que a maior adesão dos carros elétricos no mercado nos últimos anos também se deu pelo custo de aquisição dos modelos, que se tornou mais acessível.

 

— No Brasil, a entrada de grandes montadoras chinesas, como a BYD, com preços competitivos, impulsionou uma redução nos preços de carros elétricos de outras marcas. Outro fator importante é a queda nos custos de produção das baterias, que representam cerca de 60% do custo total de um carro elétrico. Com a combinação de preços mais competitivos e incentivos governamentais, a aquisição de um carro elétrico se torna cada vez mais viável — destaca.

Pioneiros

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Dados mostram crescimento
de elétricos emplacados em SC

Dados mostram crescimento de elétricos emplacados em SC

A Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE) divulgou dados do primeiro semestre de 2024 que mostram que o Brasil atingiu a marca de 79.304 veículos leves eletrificados vendidos no período.

 

O levantamento considera como veículos eletrificados a soma de veículos elétricos híbridos (HEV), veículos elétricos híbridos plug-in (PHEV) e veículos elétricos 100% a bateria (BEV). São levados em conta automóveis comerciais leves, sem incluir ônibus, caminhões e veículos elétricos levíssimos, como scooters, patinetes e bicicletas. Com isso, o país já atinge a marca de 299.735 veículos eletrificados leves em circulação desde 2012, quando se iniciou a série histórica da ABVE. 

 

Por sua vez, dados do Detran apontam que Santa Catarina tem uma frota total de 22.735 veículos eletrificados. Nesse levantamento, são incluídos veículos leves, pesados e levíssimos. Entre as cidades com maior número de veículos eletrificados em circulação, de acordo com o órgão estadual, Florianópolis lidera com 4.004. Na sequência aparecem Balneário Camboriú, com 2.399 veículos, e Joinville, com 1.695. 

 

Confira as dez cidades catarinenses com maior frota de veículos eletrificados:

Já nos primeiros seis meses de 2024, Santa Catarina registrou o emplacamento de 5.027 veículos, o que representa 6,3% do mercado nacional de elétricos. O número de emplacamentos até metade deste ano já se aproxima do total de emplacamentos de 2023, que foi de 6.314. Como comparação, durante todo o ano de 2022 foram emplacados 3.139 carros desta categoria no Estado, um crescimento de 101% entre 2022 e 2023.

De acordo com dados da ABVE, a capital Florianópolis foi a 12ª cidade do país que mais emplacou veículos elétricos no primeiro semestre deste ano. Foram 971 carros ao longo do período, sendo 208 só no mês de junho. Balneário Camboriú aparece na 30ª colocação entre as 50 cidades que mais emplacaram veículos eletrificados, com 502 unidades. Blumenau, Joinville e Itajaí também aparecem no ranking, na 40ª, 43ª e 44ª colocação respectivamente.

 

Entre os modelos mais “queridos” pelos catarinenses, a marca chinesa BYD é de longe a favorita. A montadora lidera a lista de modelos de veículos leves eletrificados mais emplacados em Santa Catarina de janeiro a junho de 2024, segundo dados da ABVE. O modelo mais popular é o BYD Song Plus GS DM, com 721 carros emplacados no primeiro semestre. Veja a lista:

  • 1

    I/BYD SONG PLUS GS DM - 721 veículos
  • 2

    I/BYD DOLPHIN MINI GS EV - 462 veículos
  • 3

    I/BYD DOPLHIN GS 180EV - 370 veículos
  • 4

    I/BYD DOPLHIN GS 180EV - 370 veículos
  • 5

    I/GWM HAVAL H6 PREM PHEV - 225 veículos
  • 6

    I/GWM HAVAL H6 PREM HEV - 194 veículos
  • 7

    I/GWM HAVAL H6 GT - 187 veículos
  • 8

    I/BYD DOLPHIN PLUS 310EV - 152 veículos
  • 9

    I/GWM ORA 03 SKIN BEV48 - 150 veículos
  • 10

    I/BYD SEAL AWD GS 590EV - 127 veículos

A marca chinesa também é a maior montadora de carros elétricos no mundo. O destaque entre os modelos mais emplacados no Estado se dá também pela expansão da marca em território catarinense, atualmente com cinco concessionárias atuando em Santa Catarina, com outras duas nos planos da empresa.

Híbridos x elétricos

A principal diferença entre um carro elétrico de um tradicional, a combustão, é o motor. Enquanto o modelo a combustão é movido pela queima de combustível, seja ele gasolina, etanol ou diesel, um carro elétrico terá um motor elétrico e uma bateria, que servirá como fonte de energia. 

 

O professor do IFSC Adriano Bresolin detalha que, entre os carros eletrificados, existem os elétricos e híbridos. Enquanto os carros elétricos são 100% movidos a energia, os híbridos combinam as duas fontes de energia. Dessa forma, o carro consegue alternar entre os dois formatos, de forma a obter uma melhor performance na cidade e na estrada. 

 

Além disso, há algumas variáveis dentre os modelos híbridos, que combinam a combustão com o elétrico.

 

— Existem algumas variáveis onde a gente faz o misto entre a combustão e o elétrico para ter algumas vantagens que o carro elétrico ainda não tem. Porque ele tem algumas desvantagens, como a questão da autonomia — explica. 

 

Ainda dentro dos híbridos há duas propostas diferentes: os plug-in e os não plug-in. Os híbridos plug-in, ou PHEV, possuem os dois motores, tanto o elétrico quanto o a gasolina. O motorista pode carregar a bateria, que costuma ser maior, com cabo de energia. Já no caso dos não-plug-in, ou HEV, não é preciso se conectar em uma tomada para alimentar a bateria, que é abastecida pelo próprio motor a combustão, com o movimento interno do motor.

TIPOS DE AUTOMÓVEIS

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Carregar ao invés de abastecer

A bateria dos carros elétricos é de corrente contínua, da mesma forma que a existente em um celular. Para acionar o motor, é preciso transformar essa corrente em uma alternada. Já quando se carrega a bateria do carro, o que ocorre é o inverso: se pega a corrente alternada, que vem da tomada, e se transforma em contínua.

 

Existem dois tipos de carga de veículos elétricos: a carga lenta, em casa, e a carga rápida, feita nos eletropostos e em pontos de carregamento de estabelecimentos. O que diferencia o tempo de carregamento é que a carga lenta é de corrente alternada, e precisa ser transformada em corrente contínua, enquanto que a carga rápida já é de corrente contínua, sem ser necessário o processo de conversão.

 

O carregamento através de corrente alternada possibilita que o carro seja carregado na casa do proprietário do veículo, a partir da instalação de um aparelho para garantir as conexões corretas em termos de segurança. No carro, um conversor chamado de ACDC irá indicar quanto tempo é preciso carregar a bateria. Quanto maior for o carregador, mais rápida a carga, podendo variar de uma a oito horas de abastecimento. 

 

Já nos eletropostos de carga rápida, os carregadores já transformam a energia alternada para contínua, e injetam a corrente contínua diretamente na bateria, o que torna o carregamento de alta potência. Com isso, o tempo é reduzido para em torno de meia hora para alimentar de 20 a 80% do carro.

 

— A gente costuma dizer que é uma mudança de hábito. As pessoas que começam a usar o carro elétrico começam a mudar o hábito na viagem, fazer uma parada a mais, aquele cafezinho um pouquinho mais longo, tomar um café, ficar lá respondendo as mensagens no celular e aí o carro carregou — detalha o professor Adriano Bresolin.

 

Apesar da mudança na forma de abastecer, as vantagens para o bolso são muitas. O custo da energia elétrica em comparação à gasolina ou o óleo diesel é consideravelmente mais barato. Enquanto que 10 litros de gasolina — equivalentes a um consumo em 100 quilômetros de distância em um carro a combustão — custa em torno de R$ 60 em Santa Catarina, a mesma distância irá gerar um consumo de cerca de 15 kilowatt em um carro elétrico.

 

— Se você pagar a tarifa normal, que custa em torno de R$ 0,70, R$ 0,80, esses 15 quilowatts vão te custar em torno de R$ 12. Se você abastecer num eletroposto pago, das redes que têm na estrada, que está em torno de R$ 2 por quilowatt, esses 15 quilowatts já vão custar R$ 30 — calcula o pesquisador do IFSC.

 

Adriano ainda levanta uma terceira hipótese, que além de ser a mais econômica, seria a mais sustentável delas: 

— Se você tem um carro elétrico e instala placas solares na sua casa, gerando sua própria energia, eventualmente você pode andar de graça, com a energia solar que você mesmo produziu.

AS TECNOLOGIAS QUE FAZEM A DIFERENÇA

Com a crise do Petróleo no início da década de 1970, houve um novo interesse pelo carro elétrico. Mas os resultados positivos aconteceram somente neste século, com o desenvolvimento de tecnologias realmente eficientes a ponto de fazer frente aos veículos movidos à combustão.

Tempo de carga

Carga lenta

Ocorre em tomadas domésticas e se caracteriza pela baixa potência do carregador.

7h a 10h

Carga normal

Carregadores AC fornecem energia e a  conversão para DC é  feita pelo conversor interno do veículo. O tempo de carga
depende da potência deste conversor.

1h a 3h

Carga rápida

Em corrente contínua, a energia é aplicada diretamente na bateria do carro.

menos de 1h

Bateria recarregável

Dispositivo que transforma energia química em energia elétrica, e a armazena para alimentar o motor. As mais comuns são as baterias de íon lítio*, o metal mais leve encontrado na natureza. As baterias possuem alta densidade energética e vida útil prolongada.

*O banco de baterias é formado por dezenas, centenas ou milhares de células de lítio organizadas em série e paralelo, conforme a potência necessária.

Módulo de controle

A principal função é a gestão de energia, regulando a distribuição da bateria para o motor elétrico e outros sistemas do veículo. Em conjunto com o controlador da bateria (BMS), o módulo de controle gere a energia do veículo, tanto na aceleração como na regeneração.

Motor elétrico

No motor, a corrente elétrica gera força rotacional através do eletromagnetismo. O sistema de engrenagens transmite essa rotação para as rodas, movimentando-as para frente ou para trás. É silencioso.

Inversor de Frequência

Através da variação da frequência, o Inversor controla a velocidade do motor. Além disso, o equipamento também é responsável pela transformação da energia Contínua da bateria em energia Alternada que irá acionar o motor.

Freio regenerativo

O carro consome energia na aceleração. Mas durante a frenagem ou desaceleração, a energia cinética que seria desperdiçada é convertida em energia elétrica e armazenada na bateria do veículo.

(Passe o mouse sobre as imagens para mais detalhes)

Modo Tração

O mecanismo elétrico atua como motor, consumindo energia.

 

Modo Frenagem

O mecanismo opera como gerador de energia elétrica.

AS TECNOLOGIAS QUE FAZEM A DIFERENÇA

AS TECNOLOGIAS QUE
FAZEM A DIFERENÇA

Com a crise do Petróleo no início da década de 1970, houve um novo interesse pelo carro elétrico. Mas os resultados positivos aconteceram somente neste século, com o desenvolvimento de tecnologias realmente eficientes a ponto de fazer frente aos veículos movidos à combustão.

SC adapta infraestrutura
para o mercado

SC adapta infraestrutura para o mercado

Com o aumento do número de carros elétricos, o Estado têm registrado também um crescimento na infraestrutura de eletropostos para atender a demanda. Além de postos de abastecimento nas rodovias, outros locais como mercados, universidades, shoppings e estabelecimentos comerciais têm avançado na instalação de pontos para carregamento de veículos elétricos.

 

Conforme informações da ABVE, Santa Catarina possuía 622 eletropostos disponíveis para abastecimento de carros elétricos em março deste ano. O dado torna o Estado o detentor do quarto maior número de eletropostos disponíveis no Brasil. Ao todo, o país contava com 7.758 eletropostos.

Um dos projetos que têm impulsionado o crescimento dos pontos em Santa Catarina é o Eletroposto Celesc, desenvolvido pela Fundação CERTI. A iniciativa conta com 34 estações de carregamento espalhadas pelo Estado, além de sistemas de armazenamento de energia e um aplicativo onde o motorista pode conferir os postos disponíveis, escanear o código da estação e realizar o pagamento da recarga.

 

De acordo com a Celesc, há previsão de ampliação do projeto com 20 novas estações instaladas ainda em 2024. O objetivo da fase atual é criar um modelo de negócios para tornar a infraestrutura atual autossustentável.

 

Os recursos que financiam o Eletroposto Celesc são por meio do Programa de Pesquisa e Desenvolvimento Aneel/Celesc, com contrapartida do local onde o equipamento está instalado. Atualmente, há estações em Araquari, Lages, Florianópolis,  Porto Belo, Jaraguá do Sul, São Bento do Sul, São José, Nova Veneza, Tubarão, Balneário Camboriú,  Blumenau, Rio do Sul, Curitibanos, Laguna, Treze Tílias, Concórdia, Chapecó, São Miguel do Oeste, Maracajá, Alfredo Wagner, Criciúma, Joaçaba e Campos Novos.

Fábrica de elétricos catarinense
pode se tornar real

Fábrica de elétricos
catarinense pode
se tornar real

Fábrica de elétricos catarinense pode se tornar real

O professor do IFSC Adriano Bresolin coordena na instituição o Projeto de Mobilidade Elétrica ANEEL-IFSC-CELESC. A iniciativa propõe a conversão de carros a combustão em carros elétricos. O projeto, que tem como parceiro a Celesc, pretende trazer soluções para modernizar a frota de veículos públicos e já tem uma parceria com os Correios para adaptar um utilitário que será usado para fazer entregas.

 

Os alunos do Laboratório de Eletromobilidade do IFSC já produziram um veículo elétrico completamente do zero, que teve duas versões. Agora, a ideia é que um outro modelo em desenvolvimento funcione como um transporte coletivo autônomo em Florianópolis.

Nós somos formadores de mão de obra, nós criamos pessoas e não carros. E os carros precisam de manutenção. Nosso grande objetivo sempre foi nos preparar para treinar essas pessoas para essa nova área que está vindo aí — afirma.

É o que também destaca Zízimo Moreira Filho, diretor geral do campus Florianópolis do IFSC, professor e engenheiro mecânico. O pioneirismo do projeto relembra outra fase da instituição, também no setor de carros, algumas décadas atrás.

 

O laboratório e essa linha criados aqui foram um projeto pioneiro. A gente tem uma história de estar à frente de algumas etapas. Até então, lá nos anos 80, nós tínhamos os veículos carburados e, quando começou os veículos de combustão com injeção eletrônica no Brasil, ninguém conhecia. Então, a gente procurou se capacitar naquela época para poder ser pioneiro e começar a dar a capacitação para as oficinas mecânicas da Grande Florianópolis e do Estado — afirma o diretor geral.

 

O laboratório conta com bancadas didáticas, com tecnologia da marca Beifang, maior empresa de treinamento automobilística da China, sendo o único do país com esse material. Elas correspondem a diferentes partes do carro, correspondentes a um elétrico da BYD e a um híbrido da Toyota, e são utilizadas para o estudo dos alunos.

 

O professor Adriano Bresolin destaca que o Brasil domina o processo de fabricação de veículos. São mais de 40 montadoras no país e, além disso, algumas cidades catarinenses abrigam fábricas nacionais de veículos, como ônibus. A existência de uma multinacional como a WEG, que produz os componentes necessários para a produção dos carros elétricos, assim como o desenvolvimento de tecnologia e capacitação profissional no Estado, colocam Santa Catarina à frente no mercado dos elétricos em comparação com outros estados.

Humanos e robôs

A montagem de carros é uma colaboração entre humanos e robôs, onde cada um desempenha um papel específico no processo.

humanos-e-robos

Na questão de veículos elétricos especificamente, Santa Catarina está na vanguarda, porque nós temos a WEG, que produz, inclusive, equipamentos que a gente usou aqui nos carros, motores, inversores próprios para mobilidade elétrica e sem perder em nada em qualidade e competitividade com os equipamentos importados — detalha o coordenador do Laboratório de Eletromobilidade

 

A somatória entre a uma indústria de ônibus e caminhões forte no Estado, com a produção do componente principal do veículo, o powertrain, em solo catarinense, criam o ambiente propício para que Santa Catarina seja, atualmente, o único estado brasileiro com condições de fabricar um veículo elétrico totalmente nacional e ser o primeiro como uma fábrica dedicada à produção. 

 

Os alunos do laboratório são os responsáveis pelo desenvolvimento do EVIFSC 1, 2 e 3, carros elétricos desenvolvidos na instituição. O EVIFSC 1, que foi aprimorado no EVIFSC 2, utiliza um motor WEG de indução e teve um custo de cerca de R$ 20 mil.

 

Já o EVIFSC 3, ainda em construção, utiliza um chassi de Fusca, e tem o projeto de se tornar um micro-ônibus. As peças para montar a estrutura do veículo estão sendo impressas em uma impressora 3D recém-chegada no laboratório. A ideia é que o modelo seja programado para atuar sem motorista, de forma autônoma, em um projeto de mobilidade no Centro de Florianópolis. Outra sugestão é utilizar o veículo como apoio para a coleta seletiva de lixo em servidões da Capital.

 

Por sua vez, o projeto ConVerTE, desenvolvido no laboratório, já converteu quatro veículos a combustão em elétricos, sendo dois deles com tecnologia nacional, da WEG, e outros dois com tecnologia importada. Um dos carros, um Renault Kwid, foi convertido em híbrido e é único no mundo por ter motores no interior das rodas.

 

Nosso projeto se preocupou muito em converter os veículos velhos em novos elétricos agora com um lema: “uma nova vida sem emissões”. Ou seja, a gente está procurando uma autorização para elétricos, algumas vezes híbridos, e fazendo com que esse carro tenha uma nova vida — explica o professor Adriano Bresolin. 

 

A parceria assinada com os Correios prevê a conversão de uma Fiorino em elétrica. O professor Adriano explica que a ideia é comparar se vale mais a pena a compra do modelo já elétrico ou a conversão, com foco também em carros antigos em circulação. 

Outra iniciativa de destaque em Santa Catarina ocorre em Criciúma, no Sul do Estado, em que a prefeitura detém o título de maior frota de carros elétricos do país. No início deste ano, foram substituídos 100 carros a combustão por veículos elétricos, movidos a baterias recarregáveis. 

 

Os carros do modelo JAC e-JS1 são para atividades administrativas de setores da prefeitura, visando a redução de emissões de carbono, a melhora da eficiência energética e responsabilidade ambiental do município. A cidade também recebeu 75 carregadores para serem instalados em pontos estratégicos de prédios públicos, como o Paço Municipal Marcos Rovaris.

 

Foram investidos R$ 12,6 milhões de recursos que fazem parte do Programa Criciúma Sustentável, que busca desenvolver projetos com foco no desenvolvimento mais consciente. O investimento, contudo, é visto em economia para o município.

 

— É a cidade que ainda está conectada com o passado, mas conectando-se, cada vez mais, com o futuro. Para cada R$ 10 que gastávamos com outros carros, esse [os elétricos] a gente gasta somente R$ 1 — afirma o prefeito de Criciúma, Clésio Salvaro.

Elétricos ajudam o planeta

Além das vantagens para o bolso, o principal diferencial dos carros elétricos é o impacto ambiental. A transição para esse tipo de veículo colabora para um ar mais limpo nas cidades, reduzindo a pegada de carbono do transporte e as emissões que influenciam nas mudanças climáticas.

 

— Veículos elétricos são intrinsecamente mais eficientes que os movidos a combustíveis fósseis, como a gasolina. A queima desses combustíveis em motores de combustão interna libera uma série de poluentes atmosféricos, com impactos tanto na qualidade do ar local quanto no aquecimento global — afirma o pesquisador da UFSC Mauricio Uriona.

 

O professor detalha que carros elétricos não emitem poluentes durante a operação. Ainda, as baterias têm um ciclo de vida que não se encerra na utilização nos veículos, podendo ser usadas em outras aplicações.

 

— Mesmo após perderem parte de sua capacidade de armazenamento, essas baterias ainda podem ser reaproveitadas em diversas aplicações. Um exemplo notável é o uso como sistema de backup para energia solar em residências — detalha.

 

O professor de Engenharia Mecânica Ricardo Rüther, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), coordenador do Grupo Fotovoltaica, também afirma que só haveria um impacto ao meio ambiente caso as baterias fossem parar em um lixão, o que não deve ocorrer pelo alto valor dos materiais.

 

— Você não vai encontrar uma bateria de carro elétrico descartada num lixão porque vai valer muito mais a pena reciclá-la — explica.

 

Com uma “segunda vida”, se reduz a necessidade de produzir novas baterias, segundo o professor. Assim, se contribui para a sustentabilidade e a economia circular, reduzindo o impacto ambiental desses componentes.

 

Além da destinação das baterias dos carros elétricos, outra questão que merece destaque é a das fontes de energia, já que são delas, consequentemente, que provém a energia que “abastece” os veículos. Dessa forma, ainda que um carro seja elétrico, se a fonte também for poluente, os veículos deixam de ser por si só uma “solução”.

— O crescimento das fontes de geração renováveis, como a solar, eólica e hidrelétrica, potencializa ainda mais a sustentabilidade dos carros elétricos. Ao abastecer um carro elétrico com energia gerada por fontes renováveis, eliminamos praticamente todas as emissões de gases do efeito estufa associadas ao transporte, contribuindo significativamente para a descarbonização do setor — esclarece o professor da UFSC, Mauricio Uriona.

A matriz energética brasileira se destaca por já ser predominante limpa, com cerca de 80% da capacidade de geração proveniente de fontes renováveis, como solar, eólica e hidrelétrica. 

 

— A matriz de geração de energia elétrica no Brasil hoje vem crescendo praticamente só com energia solar e eólica. Por isso, qualquer carro elétrico novo irá demandar energia elétrica que será produzida por uma dessas duas fontes renováveis. Somente em países com matriz elétrica predominantemente fóssil, como China e EUA, os carros elétricos terão uma “pegada cinza” — afirma o professor Ricardo Rüther.

Expediente

 

Reportagem: Nathalia Fontana
Design: Ciliane Pereira
Infografia: Ben Ami Scopinho
Fotografia e vídeo: Lucas Amorelli
Edição: Luana Amorim
Coordenação geral: Raquel Vieira

Publicado em 3/8/2024