Floripa 349 anos

NSC percorre a história da Capital desde a tradição até o desenvolvimento tecnológico

Entre laços com a cultura tradicional e a aproximação com o desenvolvimento tecnológico, Florianópolis completa 349 anos neste 23 de março. A Ilha da Magia, berço dos florianopolitanos – também conhecidos por “manezinhos da Ilha” –, acolhe gente de todos os cantos, com os mais diferentes sotaques e culturas. Mas quando essa história começou? 

 

Os indígenas foram os primeiros habitantes da região onde hoje é Florianópolis e há indícios dessa ocupação humana nos sítios arqueológicos e sambaquis. Depois, a Ilha transformou-se em ponto de abastecimento de água e alimentos para embarcações que integravam expedições marítimas.

 

E só mais tarde, em 1673, segundo o Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina, o bandeirante da capitania de São Vicente, em São Paulo, Francisco Dias Velho Monteiro, chegou na região, onde se instalou. 

 

Acompanhado pela esposa, cinco filhos, dois padres, uma família agregada, cerca de 500 indígenas, fundou o povoado de Nossa Senhora do Desterro (atual Florianópolis). O território ainda fazia parte da Vila de Laguna, ligação que foi rompida em 23 de março de 1726, quando Desterro teve sua emancipação político-administrativa e se tornou vila.  

 

Em 1756, chegaram na região imigrantes europeus e, depois, pessoas escravizadas da África. Eram amas de leite aguadeiros, lavradores e trabalhavam nos engenhos de mandioca. 

 

Em 1823, a vila tornou-se Capital da Província de Santa Catarina e passou a ser chamado de Cidade do Desterro. Depois da Proclamação da República, em 1893, o marechal Floriano Peixoto reprimiu seus opositores durante a Revolução Federalista e venceu o conflito. 

 

Em 1894, o então governador Hercílio Luz sancionou a mudança no nome da cidade de Desterro para Florianópolis, em homenagem ao marechal.   

 

Em 2015, a Câmara Municipal de Florianópolis aprovou um projeto de lei que definiu que o aniversário da cidade seria baseado no ano de fundação (1673) e não no ano de emancipação (1726). Mas, apesar a cidade ter ficado 53 anos “mais velha” com a aprovação do projeto, o dia e o mês de celebração do aniversário foram mantidos: 23 de março. 

 

Era quase tudo mar

Quando Dias Velho chegou à Ilha de Santa Catarina construiu uma pequena capela, de pedra e cal, onde hoje está localizada a Catedral Metropolitana de Florianópolis. Foi a partir desse local que a cidade começou a se estruturar com ruas, casas e comércios. 

 

Em 1851, o Mercado Público foi inaugurado, mas devido à desorganização e problemas higiênicos enfrentados pelos comerciantes, um novo prédio foi construído e inaugurado em fevereiro de 1899.   

 

Anos depois, em 1928, a cidade ganhou um novo ponto de encontro: o Miramar. O bar ficava ao lado de um trapiche, próximo à Praça XV, e se consolidou como um dos pontos mais tradicionais de Florianópolis.  

 

— O Miramar era um ponto de encontro do manezinho, de cultura, de música, de poesia e que acabou sendo destruído para a construção de um aterro lá na década de 1970 — explica o jornalista e guia de turismo, Rodrigo Stüpp.

"É UM LUGAR QUE NOS DEIXA MUITA SAUDADE, SABE?"

O objetivo do Aterro da Baía Sul era permitir o crescimento urbano da cidade — mesmo com o impacto no mar. A obra também viabilizou a construção das pontes Colombo Salles e Pedro Ivo Campos, o que permitiu que carros entrassem na ilha e entregassem alimentos no Mercado Público. 

 

Em 19 de agosto de 2005, houve um grande incêndio na ala norte do mercado e o espaço precisou ser reconstruído. Hoje, o prédio é um dos principais pontos turísticos de Florianópolis e importante ponto de encontro na cidade.

 

— Tem aquela junção do peixeiro com o pessoal do lado de cá, essa harmonia, aquela falácia do Figueirense e Avaí, esse clássico que a gente tem. O Mercado Público é isso aí, todo dia tem uma história diferente — conta Fernando de Souza, que trabalha no Mercado Público há mais de 30 anos.  

O jeito manezinho

Os turistas que escutam uma conversa entre duas pessoas que nasceram em Florianópolis podem se surpreender com a velocidade da fala e com algumas expressões que só quem é daqui sabe o que significa. Veja alguns desses termos e seus significados:

As tradições da Ilha

O Ribeirão da Ilha é um dos bairros mais tradicionais de Florianópolis e mantém a influência da colonização açoriana. Pelas ruas tranquilas, com ares de interior, é possível perceber que a maioria das casas tem arquitetura semelhante ao dos portugueses da Ilha dos Açores — simples, coloridas e com grandes janelas retangulares. 

 

 

— Tem uma identidade cultural muito baseada na herança cultural dos casais açorianos, ainda alicerçada também sobre aspectos culturais dos indígenas, e com ingredientes, para a formação dessa cultura, dos escravizados que por aqui também habitavam e hoje ainda habitam seus descendentes — explica o historiador Francisco do Vale Pereira. 

 

Outra tradição do Ribeirão da Ilha é a Festa do Divino. Nos meses de maio e junho, um cortejo sai da Praia de Naufragados em direção à Igreja Matriz, no centro do bairro. No trajeto de 15 quilômetros, a bandeira do Divino se torna símbolo de benção para as casas da comunidade.  

 

— Naufragados dá continuidade à cultura, tanto que a bandeira do Divino começa ali. A pesca da tainha é bicentenária em Naufragados. Assim como a história, a cultura é dinâmica, então vai agregando outras coisas, mas não se perde a essência — afirma o condutor ambiental Ademar Alarico. 

 

 

A gastronomia do Ribeirão da Ilha também orgulha os moradores do local, pois é dali que sai parte das ostras consumidas em todo o Brasil. O bairro se tornou referência e recebe turistas brasileiros e estrangeiros que chegam em busca da culinária do bairro.  

 

 

— O Ribeirão se destacou no cenário nacional com a produção de ostras e criou um vínculo muito forte com a gastronomia. Hoje a gente tem uma rota gastronômica com alguns restaurantes e a maioria à base de ostra — pontua o chef de cozinha Bruno Gonçalves. 

 

Lá vem o boi

Além de símbolos da cultura popular como a renda de bilro e a pesca da tainha, o Boi de Mamão é um dos principais representantes das tradições de Florianópolis. O boi feito de madeira e bambu e coberto de tecidos é o grande personagem de uma narrativa sobre a morte e ressurreição do animal, que é curado por uma intervenção sobrenatural.  


—  Na tese do professor Nereu do Vale Pereira, ele coloca o Boi de Mamão como algo vindo da região da Península Ibérica. Eles também têm a figura do boi, do cavalinho, claro que dentro de outro contexto, porque a cultura vai se modificando e é dinâmica. Aqui ela ganhou outro formato. Também tem um pouco da influência do Bumba Meu Boi, porque o enredo é o mesmo e fala sobre a morte e ressurreição do boi, que está muito ligado com a cultura cristã — explica Claudio Andrade, presidente do Conselho de Boi de Mamão de Santa Catarina.   


A manifestação folclórica, que está em Florianópolis há mais de 200 anos, reúne diferentes personagens: o vaqueiro, o menino Mateus, o doutor que tenta curar o boi, a benzedeira, a Maricota, a Bernunça, o cavalinho e a cabra – confeccionados de semelhante ao boi – o cachorro, o urubu, o macaco e os ursos branco e preto. Andrade destaca um detalhe importante na brincadeira: apresentação deve ser conduzida pela cantoria.

Florianópolis tem hoje 10 grupos tradicionais que formam o Conselho de Boi de Mamão da Capital: o do Itacorubi (que tem quase 60 anos), do Pantanal, de Sambaqui, da Barra da Lagoa, do Ribeirão da Ilha, do Campeche, de Jurerê, Vargem Grande e o de Santo Antônio de Lisboa. A intenção dos membros do conselho é tornar esse símbolo da cultura popular cada vez mais forte e organizado na cidade. 

 

Entre 23 de março e 23 de abril, os visitantes e moradores de Florianópolis poderão acompanhar o Festival Vou Botar Meu Boi na Rua, que terá apresentações dos grupos tradicionais. 

Confira o calendário

23 de março

Trapiche da Beira-Mar Norte: desfile às 14h e início das apresentações às 15h 

27 de março

Rua Cônego Serpa, ao lado da Casa de Cultura – Santo Antônio de Lisboa: desfile às 14h e início das apresentações às 15h 

9 de abril

Praça Matriz do Ribeirão da Ilha: desfile às 14h e início das apresentações às 15h 

23 de abril

Praça do Pescador – Barra da Lagoa: desfile às 14h e início das apresentações às 15h

A Ilha do Silício

Além de ter belas paisagens e um Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) considerado alto, a cidade que tem hoje mais de 500 mil pessoas é um fenômeno para a indústria de tecnologia, sendo chamada por muitos de “Ilha do Silício”, em alusão ao Vale do Silício, nos Estados Unidos, que reúne muitas startups. A indústria da tecnologia em Florianópolis movimenta R$ 8,5 bilhões e tem ainda grande oferta de vagas de emprego, devido à falta de mão de obra qualificada.   

 

Segundo os dados do Tech Report 2021, elaborado pela Associação Catarinense de Tecnologia (Acate), entre 2015 e 2020, o número de empresas do setor cresceu 63,2% em todo o Estado, e a região da Grande Florianópolis é a que mais concentra empresas deste ramo (32,6%).  

 

Entre as cerca de 6 mil empresas instaladas na Grande Florianópolis, metade está na Ilha. Esse ecossistema envolve aproximadamente 8 mil empreendedores e gera mais de 30 mil empregos. 

 

— A pandemia acelerou a necessidade em tecnologia e, no ano passado, o investimento que o Brasil teve nessa área foi recorde. Em 2021, a maior transação do setor foi com empresas de Florianópolis e houve R$ 5 bilhões de investimentos em empresas de tecnologia da cidade. Isso realmente atrai outras empresas — explica o presidente da Acate, Iomani Engelmann.    

 

Segundo Iomani, o fato de Florianópolis ter se tornado um polo de destaque na área da tecnologia é resultado de diferentes fatores que tem se consolidado ao longo dos anos.  

 

— Há 35 anos a gente vem se tornando uma cidade tecnológica; a primeira incubadora do Brasil foi aqui. E hoje na cidade temos incubadoras, aceleradoras, boas universidades, vários cases e fundos de investimentos. Fora esse ecossistema, temos uma cidade com grande atrativo de moradia — afirma o presidente da Acate.  

 

Mas, nem tudo é perfeito: as empresas deste setor enfrentam a falta de profissionais qualificados para preencherem as vagas de trabalho.  

 

—  Isso é um problema global, mas também existem dois fatores principais para isso aqui no Brasil. As empresas mais tradicionais começaram a ter um investimento maior em tecnologia e, investindo mais nessa área, a demanda por profissionais aumenta. Mas, nós não aumentamos a profissionalização conforme a demanda. O outro fator é o teletrabalho, pois com o ganho de mobilidade muitos profissionais foram trabalhar em outros locais, tanto no Brasil quanto no Exterior — diz Engelmann.   

 

E quem pensa que as vagas deste setor não abrangem outras áreas, está enganado. Segundo Iomani, a partir do momento em que as empresas de tecnologia prestam serviços para outras áreas, existe a demanda por profissionais.   

 

—  Essa área também demanda pessoas especializadas em vendas, marketing, recursos humanos. É um setor pluralista. No meu quadro funcional, por exemplo, têm biomédicos e pessoas da área da saúde. A gente acaba absorvendo pessoas de outras áreas porque direcionamos a tecnologia para setores específicos — explica o presidente da Acate.  

 

A expectativa é de que nos próximos anos Florianópolis esteja ainda mais consolidada neste setor e atraindo mais investimentos.    

 

— Olhando para o futuro, vejo que estamos em uma crescente. Durante a pandemia nós atraímos grandes volumes financeiros e Florianópolis tem se destacado na geração de talentos —87 avalia Engelmann.   

Expediente

Camilla Martins


Marina Dalcastagne


Reportagem

Tiago Ghizoni


Casa da Memória de Florianópolis

Imagens 

Raphaela Suzin 

 

 

 

Edição  

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