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CHEFES
DO AGRO

CHEFES
DO AGRO

Cláudia, produtora de bananas, Rosi, produtora de leite, Márcia, criadora de suínos e Tatiana, produtora de algas representam uma pequena parcela das catarinenses que são líderes do agronegócio em Santa Catarina. Em um ambiente dominado por homens, empreender no agronegócio é um grande desafio para uma mulher, mas essas quatro produtoras rurais catarinenses mostram que com dedicação e força é possível quebrar paradigmas e conquistar o seu espaço. Além de esposas e mães, elas são líderes de empresas e construíram negócios de sucesso em SC.
Conforme o último censo agropecuário do IBGE, 501.811 pessoas trabalhavam em estabelecimentos agropecuários em Santa Catarina em 2017. Dessas, 328.327 homens e 173.484 mulheres. Já em relação à gerência das propriedades, apenas 10% eram gerenciadas pelo público feminino. O cenário, entretanto, tem mudado nos últimos anos.

apenas

0 %

das propriedades eram gerenciadas
pelo público feminino em 2017

Segundo a Federação dos Trabalhadores da Agricultura Familiar (Fetraf-SC), cerca de 20 mil mulheres trabalhavam no setor antes da pandemia, entre chefes de propriedade, esposas, filhas e netas. A federação aponta que, apesar de não ter um levantamento recente oficial, observou um crescimento significativo de mulheres agricultoras que abriram novos negócios durante a pandemia, e estima que esse número tenha aumentado em, pelo menos, 5%, nos últimos dois anos.

— É uma realidade que tem mudado ao longo do tempo, mas ainda não é uma realidade ideal que a gente gostaria que fosse […] Acredito que seja um contexto desde histórico, do machismo que vem das épocas remotas, mas o papel da própria mulher em se colocar à frente dos processos, por isso que a gente trabalha com meninas e mulher para que elas possam se empoderar e se colocar à frente dos processos.

Desde 2012, trabalhamos com cursos de protagonistas de jovens homens e mulheres, que possam crescer na propriedade e ser lideranças na propriedade e também nas suas comunidades — declara a presidente da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (Epagri), Edilene Steinwandter.
mulheres agronegocio santa catarina

Cláudia das bananas

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Cláudia das bananas

Depois de ficar viúva aos 32 anos, com um filho pequeno para criar, Cláudia Hess, 46 anos, precisou erguer a cabeça e tocar sozinha a plantação de bananas no interior de Balneário Piçarras, Litoral Norte de Santa Catarina. Além de lidar com o luto, ela precisou trabalhar duro e vencer vários desafios. Hoje, se orgulha de dizer que é conhecida como “Cláudia das Bananas”.

— Se precisar ir pra roça ou vou, eu dirijo o caminhão, eu ajudo na carga sou uma funcionário na carga, corto penca, não tem serviço ruim. no meu vocabulário não tem um não, você tem que tentar, como você vai dizer que não sabe se não tentou? […] A mulher tá na roça, chega em casa e ela tem o serviço todo da casa como eu. Eu lavo, eu passo, eu cozinho. Hoje a produção familiar depende muito da mulher, pois o homem qualquer coisa tá ruim — desabafa. Foi com essa força de vontade que ela conseguiu ampliar a produção e construir um negócio de sucesso. Na época, tinha três funcionários e hoje conta com 14 pessoas que trabalham em uma área de 20 hectares. As bananas de Cláudia são exportadas para outros estados e até para o exterior, comercializadas no Uruguai. Além da dedicação para ampliar o seu negócio, hoje Cláudia ajuda a desenvolver a produção de outras famílias de pequenos produtores, comprando bananas da região onde ela mora.

"Eu disse: vou conseguir sozinha, eu arregacei as mangas e trabalhei, porque tinha um filho pra sustentar. Trabalhava até a meia-noite e às quatro da manhã já estava acordada [...] Eu não consegui nada de graça, tem que ir à luta, não tem que depender do marido, tem que ir à luta" — declara.

mulheres agronegocio santa catarina

Mulher das vacas

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Mulher das vacas

Rosi Effting, 61 anos, passou boa parte da vida no papel de esposa, mãe de 4 filhos, ajudando o marido na empresa de tecnologia da família. Há 18 anos, ela decidiu ter o próprio negócio e começou a investir na criação de vacas leiteiras. Com o foco em produzir leite de qualidade, ela montou uma propriedade altamente tecnificada, em Braço do Norte, Sul do Estado.

A produtora rural conta que quando começou teve que enfrentar o machismo no campo, já que não era comum uma mulher trabalhar com o agronegócio, mas relata que o cenário mudou bastante no decorrer dos anos.

— Antigamente quando eu comecei era muito difícil. A dificuldade era bem maior de eles aceitarem esse trabalho da gente. Hoje não. Hoje evoluiu muito. E as mulheres estão do lado do marido […] Eu vejo aqui nas pequenas propriedades, em volta da gente, que antes só aparecia o homem. Hoje vão os dois juntos. Essa é a ideia. Porque são pequenos produtores, pequenas propriedades, e se eles se ajudam, aí vão embora — declara.

Para a “Mulher das Vacas”, como Rosi ficou conhecida, não tem tempo ruim. Ela faz de tudo: da ordenha até a contabilidade do negócio. Hoje tem 70 vacas, em uma propriedade de 40 hectares, e se prepara para inovar mais uma vez. Ela está inaugurando uma queijaria para aproveitar o excedente da produção de leite.

"Isso da vida pra gente. Porque geralmente quando as mulheres casam, tem filhos, dizem: "ah, agora a vida acabou". Acabou nada. Tem que ter um objetivo" — diz Rosi.

Mádi da suinocultura

Mádi da suinocultura

Filha de agricultores, Márcia Stuelp, 47 anos, cresceu na roça e sempre foi apaixonada pela suinocultura. Ela trabalhou a vida inteira no agronegócio e há três anos realizou o sonho de montar sua própria granja de suínos, em São João do Oeste. Atualmente, conta com 1.800 porcos, que são o carro-chefe do negócio. Casada e com dois filhos, a produtora trabalha em conjunto com o marido, mas a chefe da empresa familiar é a Mádi, como é conhecida. 

 

Márcia relata que já enfrentou situações de muito preconceito e percebe que as pessoas ainda se surpreendem ao chegar na propriedade e ver que a líder do negócio é uma mulher. No entanto, ela relata que os funcionários a respeitam e sentem orgulho de tê-la como chefe. 

 

— A mulher tem muito essa questão de deixar tudo arrumadinho, gosta de tudo organizado. O homem já é mais desleixado nesse sentido. E eu sou extremamente exigente […] As pessoas olham pra mim e dizem: “aquela lá é a minha patroa, ela é a chefe”. E eu tenho certeza que eles sentem orgulho disso — relata.

mulheres agronegocio santa catarina

Tati dos mares

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Tati dos mares

Filha e neta de pescadores do Ribeirão da Ilha, em Florianópolis, Tatiana da Gama Cunha, 44 anos, foi criada com uma ligação próxima ao mar. O pai começou com a produção de ostras e mariscos em 2000 e, seis anos depois, ela assumiu a gerência da fazenda marinha. Mas a Tati dos mares foi além, e buscou se especializar no cultivo de algas, que foi liberado pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) em 2020. Ela começou a produção em 2021, em parceria com a fazenda dos pais.

— Com as minhas pesquisas, eu vi que a alga poderia ser utilizada para os cosméticos. Até então eu não sabia. A gente não tem noção que os produtos que a gente usa já tem alga […] Então eu comecei a pesquisar e achei um grupo de mulheres no Nordeste, e eu quis ir pra lá pra ver se eu conseguia fazer com a alga o que elas fazem lá com outra espécie — relata.

Os experimentos que Tatiana fez com as algas no nordeste deram certo e, quando ela começou a produzir em Florianópolis, também passou a fazer a extração para os cosméticos, como shampoo, condicionador, sabonete e hidratante. De alma empreendedora, a produtora de algas está sempre em busca de inovação para o negócio. E agora também começou a produção de biofertilizantes feitos com as algas. 

— O melhor de tudo é que ajuda a natureza dos dois lados, porque o cultivo da alga melhora o ambiente onde está inserida e ainda ajuda a lavoura sem ter um agrotóxico — destaca.

Assim como todas as mulheres que se aventuraram na gestão de negócios em um meio predominantemente masculino, Tatiana relata que foi necessário muita coragem. Segundo ela, quase 95% das pessoas que trabalham com maricultura são homens — tanto os proprietários das fazendas quanto os funcionários. Mas ela conta que é tão respeitada que foi convidada para ser presidente da Associação de Maricultores do Sul da Ilha. Atualmente, está no sexto mandato, o que mostra a confiança que os maricultores têm no trabalho dela. Para Tati, o papel de liderança “é muito gratificante”.    

expediente

REPORTAGEM Fernanda Mueller | Eveline Poncio
EDIÇÃO Raquel Vieira
WEBDESIGN Tayná Gonçalves
IMAGENS Tiago Ghizoni (Tati dos mares), Sicoob (Cláudia das bananas) e arquivo pessoal (Mádi da suinocultura, Mulher das vacas)