Alunos interagem em momento de recreação na Escola Municipal Monsenhor Sebastião Scarzello, em Joinville (SC). Após cinco anos desativada pelo Estado, e danificada por vandalismo e abandono, prédio foi assumido pela prefeitura e ressurgiu como um colégio moderno (Foto: Diorgenes Pandini, B.D., 04/12/2019)

UMA CHANCE DE RENASCER?

Muitas histórias de escolas que chegaram ao fim tiveram final feliz. Conheça alguns casos em que o processo de desativação levou a condições melhores de estudo, apesar da burocracia. Para alguns estudiosos do tema, como o economista Ricardo Paes de Barros, o momento pelo qual o país passa do ponto de vista demográfico – que provoca a queda na demanda por matrículas e o consequente fechamento de escolas – pode ser uma janela de oportunidades para melhorar a qualidade da educação, modernizar as estruturas, sem aumentar os gastos públicos. Especialistas também sugerem, no entanto, formas menos traumáticas para fazer a reorganização de escolas e alertam: é preciso acompanhar de perto os alunos impactados pelas desativações para evitar o agravamento da desistência dos estudos

POR CRISTIAN EDEL WEISS

O que por cinco décadas representou uma sala de aula estava desfigurado. Não tinha mais carteiras. O piso da antiga classe exibia manchas de fuligem, resultado de um incêndio possivelmente provocado por invasores. As vidraças estavam quebradas. Os banheiros não tinham mais parte da louça. O pátio perdeu o telhado. A vegetação havia tomado conta de tudo o que o concreto não cobria. Na velha quadra de esportes, por quatro outonos o piso submergia em camadas de folhas secas. As traves e aros sucumbiam corroídas pela ferrugem. O retrato da Escola Estadual Monsenhor Sebastião Scarzello em setembro de 2017 era desolador, mas dois anos mais tarde tudo renasceria num final feliz.

 

O colégio de ensino fundamental do bairro Itaum, em Joinville, Norte de Santa Catarina, fechou as portas em 2011, por interdição da Vigilância Sanitária, motivada por vazamentos de esgoto. A estrutura da escola já estava decadente, e a interdição foi apenas o estopim para interromper as atividades. Além disso, a unidade tinha 418 estudantes no último ano de funcionamento, XX a menos do que quatro anos antes.

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A então estudante de Direito, Tayane Mendonça, acompanhou a reportagem na visita ao prédio desativado em 2017. Ex-aluna da escola no ensino fundamental até 2009, Tayane lamentava o que via, enquanto lembranças se reavivavam:

"É uma pena perder uma escola que a gente estudou a infância inteira. É de partir o coração"

Tayane Mendonça, ex-aluna da Escola Estadual Monsenhor Sebastião Scarzello, desativada em 2011.

Enquanto a demanda por escolas dos anos finais do ensino fundamental caía ano a ano e motivava o governo estadual a reaver planos para a Monsenhor Scarzello, a prefeitura da cidade identificava a necessidade de ampliar a oferta de vagas para o ensino infantil e para os anos iniciais do fundamental. A burocracia provocou um vai e vem nas decisões para a cessão do espaço. Em julho de 2016 ficou decidido que a prefeitura assumiria o prédio e as atividades no local. No ano seguinte, começaram os primeiros reparos para reabir como pré-escola e classes de anos iniciais, do 1º ao 5º do fundamental.

O fato de atender ao mesmo núcleo comunitário conforta quem viu as ruínas do prédio, como Tayane:

"Agora retornando a escola, é gratificante para a gente. É uma conquista, na verdade"

Tayane Mendonça, ex-aluna da Escola Estadual Monsenhor Sebastião Scarzello.

DECLÍNIO E RENASCIMENTO DE UMA ESCOLA

A agora Escola Municipal Monsenhor Sebastião Scarzello ganhou vida novamente e se tornou um símbolo de que é possível um educandário ressucitar, mesmo após ter sofrido com o abandono do espaço. Além de o antigo prédio estadual ter sido restaurado pela prefeitura, com equipamentos modernos e acessibilidade, a escola nasce com proposta de ser bilíngue, adicionando a Língua Brasileira de Sinais (Libras) ao currículo. A nova escola, aliás, já nasceu uma referência em acessibilidade entre as escolas públicas de Santa Catarina.

 

Em 2022, a escola atenderá 561 alunos de 1º a 5º anos do Ensino Fundamental e 150 alunos da Educação Infantil, segundo a Secretaria Municipal de Educação de Joinville. Há 16 alunos matriculados para as turmas bilíngues. São crianças com algum tipo de deficiência auditiva, ensinadas por meio de uma metodologia especial, que prioriza o ensino de Libras como língua materna dos estudantes e permite que também sejam alfabetizados em língua portuguesa.

 

Segundo a prefeitura de Joinville, a recuperação inicial da Monsenhor Scarzello para reabrir as portas custou R$ 670 mil, totalmente com recursos municipais. Ainda assim, aquém dos R$ 2,2 milhões inicialmente orçados para todo o espaço, porque, segundo a Secretaria Municipal da Educação, os valores prometidos pelo Estado como contrapartida na época da cessão da antiga estrutura ainda não foram repassados. A maior parte desse montante esperado seria destinada à construção da quadra coberta projetada para a nova escola.

 

Apesar dos prejuízos ao patrimônio pela burocracia na cessão do espaço, na Monsenhor Scarzello o processo de municipalização – uma das principais causas de desativação de escolas no Brasil – teve um final feliz.

Iago Mesquita caminha na escola recém inaugurada pelo Estado em Joinville, a Bailarina Liselott Trinks. Estrutura moderna recebeu ex-alunos das escolas Ruben Schmidlin e Maestro Francisco Manoel da Silva, que foram fechadas no meio do ano letivo de 2017 pelo governo do Estado

Foto: Léo Munhoz, B.D. 31/08/2017

Alunos movidos a nova escola relatam melhoria na estrutura e na aprendizagem

Ainda em Joinville, duas escolas estaduais são fechadas, no meio do ano letivo, para nascer uma nova.  Apesar da mudança repentina, estudantes avaliam que foi para melhor. Era o fim do primeiro semestre de 2017, quando alunos da Ruben Schmidlin, no Morro do Meio, e da Maestro Francisco Manoel da Silva, no Bairro Vila Nova, foram notificados que as duas unidades não existiriam mais após o recesso de inverno. Embora o Estado argumente que informou da mudança no início do ano letivo, alguns alunos só souberam da notícia quando retornaram das férias. Houve protestos, que contestavam o fato de a Secretaria de Estado da Educação ter decidido finalizar as atividades na metade do ano, sem esperar pelo encerramento das turmas.


A razão para a mudança intempestiva era a conclusão das obras do prédio da Bailarina Liselott Trinks, uma ampla e moderna escola estadual na região, mas que fica a até 7 quilômetros de distância das unidades desativadas. Na Ruben Schmidlin, os estudantes do período noturno dividiam espaço com a escola de mesmo nome da prefeitura, que oferece durante o dia turmas de ensino fundamental. Eles não tinham biblioteca e laboratórios e estavam restritos às atividades em sala de aula. Já a Maestro Francisco Manoel da Silva tinha um prédio muito antigo, de seis décadas, que segundo a Secretaria de Estado da Educação já não comportava mais o modelo de ensino atual. Hoje, no local, funciona uma escola de ensino fundamental da prefeitura.


Mais de 700 alunos das duas escolas tiveram de mudar de rotina. A prefeitura forneceu transporte para os alunos, que passaram a esperá-lo numa parada em frente às antigas escolas. A reportagem acompanhou o trajeto dos estudantes nos primeiros dias de mudança e testemunhou que o serviço era pontual e atendia a demanda. São veículos do tipo para turismo, com ar-condicionado e poltronas acolchoadas.


A Bailarina Liselott Trinks tem 6 mil metros quadrados de área construída em dois andares num terreno de 10 mil metros quadrados. Foram investidos R$ 10 milhões com recursos do Estado e do Ministério da Educação. Além disso, oferece ginásio de esportes completo, com sala de jogos, tem auditório com 200 lugares para apresentações artísticas e eventos, espaços de convivência, cozinha industrial equipada, sete laboratórios (entre eles de informática, geografia e biologia) e capacidade para 1,4 mil alunos. A unidade segue o modelo de novas escolas que o governo estadual tem construído desde o final da década passada, em parte, pensando nas demandas do Novo Ensino Médio.


A escola ainda opera abaixo da capacidade projetada. Em 2021, estavam matriculados na Bailarina 853 estudantes, dos quais 807 do Ensino Médio, segundo a Secretaria de Estado da Educação.

A antiga realidade

Mais de 700 alunos dos anos finais do Ensino Fundamental e do Ensino Médio estudavam nas escolas estaduais Ruben Schmidlin (à esquerda) e Maestro Francisco Manoel da Silva (à direita) até a metade do ano letivo de 2017. Na primeira, o prédio era compartilhado com uma unidade municipal, e os alunos não tinham biblioteca e quadra de esportes, além de haver reclamação constante de falta de professores. Na segunda escola, o prédio de mais de 60 anos estava precário e obsoleto para o modelo atual de ensino
(Fotos: Léo Munhoz, B.D. 31/08/2017

A nova rotina

escolas fechadas e desativadas no Brasil pelos governos
escolas fechadas e desativadas no Brasil pelos governos

Com o fechamento das duas escolas, ônibus de turismo custeados pela prefeitura passaram a transportar os estudantes, que esperavam pela condução em frente às antigas unidades. Alunos foram remanejados para a escola estadual Bailarina Liselott Trinks, recém construída e que dispõe de salas de aula modernas, ginásio de esportes, anfiteatro, refeitório com cozinha industrial e laboratórios, que não eram oferecidos nos antigos prédios.

(Fotos: Léo Munhoz, B.D. 31/08/2017) 

Estudantes relataram uma experiência melhor na nova escola

Além da infraestrutura moderna, os alunos da Bailarina Liselott Trinks ressaltam a organização e o fato de ter toda a grade de disciplinas preenchida, pois nas antigas unidades havia constante falta de professores. Amanda Alves, hoje com de 20 anos, disse que a experiência na Bailarina foi positiva. Ela é uma dos ex-estudantes da Ruben Schmidlin, que ocupava salas de uma escola municipal.

 

– A Bailarina tem uma estrutura bem boa de ensino, sem comparação com a escola que eu tinha antes. Tem bastante professores. Raramente falta um professor – afirma Amanda Alves.

 

João Victor Medeiros, atualmente com 19 anos, estudava no 1º ano em 2017, quando houve a mudança de escola. Ele relata que a nova condição o estimulou a continuar estudando.

 

– A Bailarina é bem melhor do que antes, sem desmerecer a escola onde a gente estudava, mas quem conhecia como era sabe a diferença. Fiquei feliz até, com mais disposição para vir para a escola. Tudo o que a gente precisa a gente tem na escola. À noite, temos cinco aulas. Lá, a gente tinha duas ou três – destacou João Victor.

 

Assessor de direção da Bailarina Liselott Trinks durante a transição dos alunos, Gilberto Gadotti Junior diz que no início a adaptação foi mais trabalhosa, principalmente para os estudantes que não estavam acostumados a usar o transporte. Mas ressalta que a convivência fez os ex-alunos da Maestro e da Schmidlin criarem uma identidade única no novo colégio:

 

– São duas escolas e duas realidades diferentes. Durante as primeiras semanas houve uma integração boa e cada vez mais eles se viam como a escola Bailarina.

Assessor de direção da Bailarina Liselott Trinks durante a transição dos alunos, Gilberto Gadotti Junior diz que a convivência de estudantes de escolas distintas foi harmoniosa e os estimulou a criarem uma identidade única no novo colégio. 

Para Amanda Alves, ex-aluna da Ruben Schmidlin, o principal ganho com a mudança para a escola recém inaugurada foi ter o quadro completo de disciplinas, porque não havia mais falta de professores

João Victor Medeiros disse que a infraestrutura da nova escola o empolgou a continuar com os estudos.
(Fotos: Léo Munhoz, B.D. 31/08/2017

Apesar de concordarem que o novo colégio apresentava uma estrutura melhor, outros estudantes pontuaram melhorias que poderiam ser alcançadas. Iago Mesquita, hoje com 21 anos, demonstrava preocupação com a segurança no entorno da escola, pois quase foi assaltado na primeira semana de aulas. O prédio foi construído numa área ainda afastada do Bairro Vila Nova, cercada por terrenos baldios e com deficiência na iluminação pública da via de acesso. Já a estudante Kauana Rosa do Amaral considerava que o transporte poderia melhorar, principalmente a oferta de horários aos alunos que precisam trabalhar.

Antiga sala de aula abandonada do Colégio Estadual Coronel João Tarcísio Bueno, em São Gonçalo (RJ), desativada em 2015

Foto: Diorgenes Pandini, B.D., 18.12.2019

REDUZIR TOTAL DE ESCOLAS EM ESTADOS E MUNICÍPIOS POUCO REFLETIU EM AVANÇO NO PRINCIPAL ÍNDICE DA EDUCAÇÃO

E mbora argumentem que a reorganização das escolas – e o eventual fechamento de algumas delas – traz benefícios aos alunos, por conta da otimização dos custos e investimentos, os governos estaduais questionados pela reportagem não apresentaram dados concretos de melhora nos índices de aprendizagem, aprovação, evasão ou abandono. Nem mesmo exemplos práticos da aplicação mais eficiente de recursos públicos, que poderia ocorrer com a desativação de unidades ociosas, foram demonstrados nos pedidos feitos pela reportagem via Lei de Acesso à Informação ou em consultas diretamente às secretarias de Educação dos 26 Estados e do Distrito Federal.

 

Uma forma de tentar observar, ainda que de modo superficial, os efeitos do reordenamento escolar nos municípios e Estados foi verificar como se comportou na média a correlação entre as cidades que mais reduziram ou aumentaram escolas ativas no país entre 2007 e 2017 com o desempenho desses municípios no mesmo período no principal indicador do ensino brasileiro: o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb).

 

A reportagem cruzou as duas métricas para 5.562 dos 5.570 municípios brasileiros, que foram avaliados no período pelo Ministério da Educação. A análise considerou as médias municipais oficiais das notas do Ideb obtidas por escolas públicas (municipais, estaduais e, em raros casos, federais) em 2007 e 2017 para os anos iniciais (1º ao 5º) e finais (6º ao 9º) do Ensino Fundamental. No caso do Ensino Médio, foram observadas as médias atribuídas aos Estados, principais responsáveis pelo atendimento a essa etapa de ensino.

 

Na maioria dos casos, a correlação entre abrir ou fechar escolas e aumentar a nota do Ideb ainda é pouco expressiva ou não permite conclusões. Ao olhar o desempenho de Ensino Médio e anos finais do Ensino Fundamental, por exemplo, a maioria dos Estados ou municípios que mantiveram ou aumentaram a nota do Ideb em 10 anos são também aqueles que aumentaram ou mantiveram o número de escolas ativas no mesmo período. Já quando se olha para os anos iniciais do Ensino Fundamental, mais de 70% dos municípios que reduziram o total de escolas ativas entre 2007 e 2017 apresentaram, simultaneamente, aumento no Ideb no período.

Especialistas alertam, no entanto, que pode ser precipitado comparar apenas os dados do Ideb, e num prazo de somente 10 anos, pois como os fechamentos de escolas são feitos a conta-gotas, e os alunos afetados se espalham por outras escolas, as médias gerais das redes tendem a ser pouco afetadas estatisticamente. Veja a seguir um resumo do que mostram os números.

escolas fechadas e desativadas no Brasil pelos governos

Anos Iniciais do Ensino Fundamental

É a etapa onde o movimento é mais homogêneo entre 2007 e 2017. Em 71,56% das cidades com escolas públicas (municipais, estaduais e federais) que ofereciam turmas de anos iniciais de ensino fundamental (1º ao 5º ano), o crescimento da nota do Ideb ocorreu ao mesmo tempo em que o total de unidades ativas foi reduzido. Em segundo lugar está o grupo de cidades que mantiveram ou ampliaram o total de unidades ativas e aumentaram as notas do Ideb (26,5%).

 

Entre os municípios que apresentaram mais de 50% de crescimento no Ideb, 1.216 reduziram o total de escolas ativas, 213 mantiveram e 74 aumentaram.

 

Destaque para Ubatã (BA), que saltou de uma nota de 0,9 em 2007 para 4 em 2017, ao mesmo tempo em que observou a redução de 42% das escolas com anos iniciais.

escolas fechadas e desativadas no Brasil pelos governos
Anos Finais do Ensino Fundamental

Dos municípios brasileiros que apresentaram um salto na nota do Ideb entre 2007 e 2017 para turmas de anos finais do Fundamental (6º ao 9º ano) da rede pública, 61,78% também mantiveram ou ampliaram o total de escolas em atividades nesta etapa de ensino. Destaque para o município de Panelas (PE), que teve salto de 187% na nota do Ideb sem alterar o total de unidades em operação.

Em seguida, estão os municípios que ampliaram a nota, mas reduziram o total de unidades (31,06% das cidades brasileiras). Dos 587 municípios que tiveram mais de 50% de crescimento na nota do Ideb entre 2007 e 2017, 258 reduziram o total de escolas ativas, 227 mantiveram e 102 tiveram aumento.

Na outra ponta está Santa Rosa dos Purus (AC), que saltou de 1 para 40 escolas abertas com anos finais do Fundamental no período, mas reduziu em 6,5% a nota do Ideb.

escolas fechadas e desativadas no Brasil pelos governos

Anos Finais do Ensino Fundamental

Dos municípios brasileiros que apresentaram um salto na nota do Ideb entre 2007 e 2017 para turmas de anos finais do Fundamental (6º ao 9º ano) da rede pública, 61,78% também mantiveram ou ampliaram o total de escolas em atividades nesta etapa de ensino. Destaque para o município de Panelas (PE), que teve salto de 187% na nota do Ideb sem alterar o total de unidades em operação.

 

Em seguida, estão os municípios que ampliaram a nota, mas reduziram o total de unidades (31,06% das cidades brasileiras). Dos 587 municípios que tiveram mais de 50% de crescimento na nota do Ideb entre 2007 e 2017, 258 reduziram o total de escolas ativas, 227 mantiveram e 102 tiveram aumento.

 

Na outra ponta está Santa Rosa dos Purus (AC), que saltou de 1 para 40 escolas abertas com anos finais do Fundamental no período, mas reduziu em 6,5% a nota do Ideb.

escolas fechadas e desativadas no Brasil pelos governos

Ensino médio nas redes estaduais

Apenas em 2017 o Saeb, prova que responde por boa parte do cálculo do Ideb, passou a ser aplicado em todas as escolas de Ensino Médio. Além disso, em 2007 a nota do Ideb para esta etapa de ensino era calculada por amostragem. Ainda assim, os números permitem traçar uma tendência entre os Estados, aos quais cabe a competência de gerir essa fase da educação básica. 

No saldo final entre 2007 e 2017, todos os Estados aumentaram ou pelo menos mantiveram o total de escolas de Ensino Médio ativas. Mas apenas 2 deles reduziram a nota do Ideb no período: Santa Catarina (5,2% de redução no índice) e Bahia (3,57%). 

Goiás obteve o maior salto na nota do Ideb no período, 53,57%, e ampliou apenas em 11% o número de escolas ativas com Ensino Médio.

Já os três Estados que proporcionalmente mais ampliaram o número de unidades não obtiveram mais do que 11% de evolução na nota: Acre, Amapá e Roraima.

Ensino médio nas redes estaduais

Escola Municipal Rivadavia Corrêa, próxima à Central do Brasil, no Rio de Janeiro. Unidade foi uma das Escolas do Amanhã, programa que reorganizou o ensino no município e começou a colher resultados, como melhora nas notas do Ideb

Foto: Diorgenes Pandini, B.D., 17/12/2019

MOMENTO REPRESENTA CHANCE DE MUDAR A EDUCAÇÃO?

No Rio de Janeiro, um colégio acolhedor de jovens a idosos foi obrigado a fechar as portas, apesar dos pedidos da comunidade para que a decisão fosse reconsiderada. Unidade servia de rota de passagem entre o trabalho no Centro e as casas dos alunos nas comunidades. Ruptura provocou uma série de transtornos

Ainda em Joinville, duas escolas estaduais são fechadas, no meio do ano letivo, para nascer uma nova.  Apesar da mudança repentina, estudantes avaliam que foi para melhor. Era o fim do primeiro semestre de 2017, quando alunos da Ruben Schmidlin, no Morro do Meio, e da Maestro Francisco Manoel da Silva, no Bairro Vila Nova, foram notificados que as duas unidades não existiriam mais após o recesso de inverno. Embora o Estado argumente que informou da mudança no início do ano letivo, alguns alunos só souberam da notícia quando retornaram das férias. Houve protestos, que contestavam o fato de a Secretaria de Estado da Educação ter decidido finalizar as atividades na metade do ano, sem esperar pelo encerramento das turmas.

A razão para a mudança intempestiva era a conclusão das obras do prédio da Bailarina Liselott Trinks, uma ampla e moderna escola estadual na região, mas que fica a até 7 quilômetros de distância das unidades desativadas. Na Ruben Schmidlin, os estudantes do período noturno dividiam espaço com a escola de mesmo nome da prefeitura, que oferece durante o dia turmas de ensino fundamental. Eles não tinham biblioteca e laboratórios e estavam restritos às atividades em sala de aula. Já a Maestro Francisco Manoel da Silva tinha um prédio muito antigo, de seis décadas, que segundo a Secretaria de Estado da Educação já não comportava mais o modelo de ensino atual. Hoje, no local, funciona uma escola de ensino fundamental da prefeitura.

Mais de 700 alunos das duas escolas tiveram de mudar de rotina. A prefeitura forneceu transporte para os alunos, que passaram a esperá-lo numa parada em frente às antigas escolas. A reportagem acompanhou o trajeto dos estudantes nos primeiros dias de mudança e testemunhou que o serviço era pontual e atendia a demanda. São veículos do tipo para turismo, com ar-condicionado e poltronas acolchoadas.

A Bailarina Liselott Trinks tem 6 mil metros quadrados de área construída em dois andares num terreno de 10 mil metros quadrados. Foram investidos R$ 10 milhões com recursos do Estado e do Ministério da Educação. Além disso, oferece ginásio de esportes completo, com sala de jogos, tem auditório com 200 lugares para apresentações artísticas e eventos, espaços de convivência, cozinha industrial equipada, sete laboratórios (entre eles de informática, geografia e biologia) e capacidade para 1,4 mil alunos. A unidade segue o modelo de novas escolas que o governo estadual tem construído desde o final da década passada, em parte, pensando nas demandas do Novo Ensino Médio.

A escola ainda opera abaixo da capacidade projetada. Em 2021, estavam matriculados na Bailarina 853 estudantes, dos quais 807 do Ensino Médio, segundo a Secretaria de Estado da Educação.

PALAVRA DE ESPECIALISTA

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A reportagem convidou alguns dos mais renomados pensadores e autoridades da educação básica no Brasil atualmente para avaliar o processo de reorganização escolar que Estados e municípios estão fazendo, os impactos e benefícios esperados com a redução do número de escolas ativas e os cuidados na transição de alunos para evitar evasão escolar. Clique sobre as imagens para assistir às entrevistas:

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Mozart Neves Ramos,
membro do Conselho Nacional de Educação e diretor de Articulação e Inovação do Instituto Ayrton Senna

“É preciso deixar claro quais serão os ganhos e como será feita a transição dos alunos”

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Catarina de Almeida Santos,
campanha Nacional pelo Direito à Educação e professora da UnB

“O direito à educação não passa por ter grande quantidade de alunos, o poder público precisa achar uma forma de oferecer o serviço”

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Ricardo Paes de Barros,
professor de Economia do Insper e economista-chefe do Instituto Ayrton Senna

“Queda no total de matrículas e na natalidade: uma janela de oportunidade para melhorar a educação”

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Thaiane Pereira,
coordenadora de projetos no Movimento Todos pela Educação

“A reorganização escolar é um movimento que, eventualmente, várias redes vão ter que se propor a fazer”

luiz-miguel-garcia

Luiz Miguel Martins Garcia,
campanha Nacional pelo Direito à Educação e professora da UnB

“A rigor, fechar escolas com baixo número de alunos traz um saneamento financeiro bastante forte”

italo-dutra

Ítalo Dutra,
chefe de Educação do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef)

"As populações mais dispersas, mesmo que não seja em grande número, precisam de atenção. Não devemos deixar ninguém para trás"

Família em frente a uma escola primária em Cottbus, a 100 quilômetros de Berlim, na Alemanha. A cidade fechou metade das escolas primárias desde 1990, quando o país foi reunificado. Desafio hoje é reverter a situação e atender demanda crescente, por conta de imigrantes e refugiados (Foto: Cristian Edel Weiss)

PAÍS AINDA POBRE COM DESAFIO
DE NAÇÕES RICAS

O desafio que o Brasil enfrenta hoje a Europa já encarava há pelo menos três décadas. A queda na taxa de natalidade foi um desafio, sobretudo nas menores cidades, onde o envelhecimento da população é mais intenso. Mas com as políticas de atração de imigrantes e apoio a refugiados há locais com falta de vagas

No pátio central da Escola Isolada Avencal do Saltinho um mapa com três de largura cobria a parede do corredor de acesso às salas de aula, na zona rural de Mafra, cidade 56 mil habitantes, localizada no Planalto Norte de Santa Catarina. O mapa não é da cidade, tampouco veio encartado em livros didáticos. Nele, estava sinalizada a casa de cada criança do pré-escolar ao 5º ano do ensino fundamental. No centro, a escola. Com a ajuda dos alunos, as professoras desenharam o trajeto que os pequenos percorriam diariamente para chegar à sala de aula.

 

Na extremidade esquerda do cartaz estava a casa de Jéssica Mara Soares, que tinha 8 anos quando era aluna do 3º ano do ensino fundamental. A menina mora na localidade de Rio do Cedro, a cerca de 20 quilômetros da escola. Na dimensão de zona rural, onde não há estradas pavimentadas e o tempo pode ser aliado ou inimigo, dependendo do humor da atmosfera, ela leva em média uma hora e 20 minutos para ir e a mesma medida para voltar. Se chover, as estradas viram lama e o percurso se torna ainda mais lento.

Pandemia expôs problema mais latente e agravou o abandono escolar (Foto: Ricardo Wolffenbüttel / Governo SC)

PANDEMIA EXPÔS SITUAÇÃO AINDA
MAIS GRAVE DO ABANDONO

De cada 10 unidades educacionais que deixaram de funcionar no Brasil desde 2007, em média seis estavam localizadas na zona rural

Para além da recuperação dos espaços físicos, a pandemia expôs a falta de infraestrutura adequada para as escolas do país lidarem com a tecnologia. 

 

pátio central da Escola Isolada Avencal do Saltinho um mapa com três de largura cobria a parede do corredor de acesso às salas de aula, na zona rural de Mafra, cidade 56 mil habitantes, localizada no Planalto Norte de Santa Catarina. O mapa não é da cidade, tampouco veio encartado em livros didáticos. Nele, estava sinalizada a casa de cada criança do pré-escolar ao 5º ano do ensino fundamental. No centro, a escola. Com a ajuda dos alunos, as professoras desenharam o trajeto que os pequenos percorriam diariamente para chegar à sala de aula.

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Soluções a curto prazo

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Em 2013, levantamento da Unicef apontou que no Brasil havia 3,8 milhões de crianças e adolescentes em idade escolar que estavam fora da escola. Apenas Santa Catarina, que despontou entre as melhores posições nos Idebs 2007, 2009 e 2011, era o quarto estado com maior percentual de estudantes de ensino médio sem frequentar a sala de aula. A nosso ver, uma das possíveis soluções para reduzir os impactos aos alunos afetados pela desativação de escolas seria criar um protocolo de acompanhamento desses indivíduos no primeiro ano de adaptação a uma nova rotina. É a adoção de iniciativas como a busca ativa, priorizando o acompanhamento desses alunos cuja estatística sugere serem mais suscetíveis à desistência, pela ruptura provocada pela decisão governamental.

escolas fechadas e desativadas no Brasil pelos governos

O motivo: Por que escolas fecharam no Brasil

As razões por trás da redução de unidades de educação básica no país, o flagrante de um colégio que recebe a notícia do encerramento e as cicatrizes para os que ficaram órfãos de parte da própria história. Navegue nos dados e veja quantas escolas fecharam ou abriram na sua cidade

quem fez

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Reportagem e análise de dados
Cristian Edel Weiss


Imagens
Diorgenes Pandini e Leo Munhoz


Edição de imagens e vídeos
Thiago Ghizoni e João Victor Rocha


Edição
Raquel Vieira

Desenvolvimento
Tayná Gonçalves, Bruno Scheibler


Colaboração
Mayara Vieira e NSC TV


Design e visualização de dados
Tayná Gonçalves, Maiara Santos e Ângela Prestes


Gerente de Conteúdo Digital
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Mentoria
Niko Kommenda, jornalista visual do jornal The Guardian, Inglaterra, como parte do programa Dataship, de apoio ao jornalismo de dados em países em desenvolvimento, organizado pela Deutsche Welle Akademie, da Alemanha


Apoio
NSC Lab e TV Bahia